Introdução A dissecção espontânea da artéria coronária (SCAD – Spontaneous Coronary Artery Dissection) é uma causa subdiagnosticada de síndrome coronariana aguda (SCA), sendo até 70% dos casos identificados apenas na necrópsia. Embora sua incidência seja incerta, algumas séries de casos sugerem predomínio em mulheres jovens. A fisiopatologia envolve enfraquecimento da parede vascular associado ao aumento da pressão intraluminal, levando à ruptura e formação de uma falsa luz entre as camadas íntima e média do vaso. Com os avanços dos métodos diagnósticos, a cineangiocoronariografia seriada pode ser uma ferramenta crucial para o acompanhamento e tratamento desses pacientes.
Relato T.R do sexo feminino, 50 anos, admitida em hospital secundário com precordialgia caracterizada como 9/10, com irradiação para mandíbula e membros superiores. Antecedentes pessoais: hipotiroidismo e tabagismo. Eletrocardiograma evidenciou infarto agudo do miocárdio com supra de ST em parede anterolateral (V2-V6; D1 e aVL). Submetida à trombólise, sem critérios de reperfusão, sendo encaminhada ao serviço terciário para estratificação invasiva. Cineangiocoronariografia (CATE) evidenciou coronárias sem lesões obstrutivas, porém com afilamento difuso médio-distal da artéria descendente anterior (ADA). Ecocardiograma transtorácico (ECOTT) revelou disfunção ventricular grave, com fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) de 29% pelo método de Simpson. Ressonância magnética cardiovascular (RMC) identificou FEVE de 30%, miocardiopatia dilatada com disfunção sistólica importante do ventrículo esquerdo com área de fibrose de padrão isquêmico no território usualmente irrigado pela artéria descendente anterior e trombo intracavitário. Realizado tratamento clínico otimizado e encaminhada para seguimento ambulatorial. Repetido CATE quatro meses depois confirmando importante afilamento prévio da ADA com subsequente aumento da espessura do vaso, indicando reabsorção do hematoma e recuperação da arquitetura coronária.
Conclusão A SCAD pode ser mais prevalente do que se acredita, sendo frequentemente subdiagnosticada. A cineangiocoronariografia seriada, assim como a imagem intravascular, desempenha um papel fundamental no diagnóstico precoce e no acompanhamento da recuperação coronariana, permitindo melhor entendimento da doença e sua evolução clínica.