A cirurgia multivalvar (intervenção em 2 ou mais válvulas) é associada a maior mortalidade cirúrgica e menor sobrevida a longo prazo. Entretanto, estudos são antigos, heterogêneos e com baixa representatividade de países em desenvolvimento, onde a doença reumática é prevalente. Objetivo:comparar dados clínicos e desfechos entre pacientes submetidos a cirurgia uni e multivalvar. Métodos:pacientes submetidos a cirurgia valvar nativa foram categorizados em grupos de cirurgia uni e multivalvar. Foi realizada análise comparativa de características clínicas, etiologia e desfechos em 30 dias, além de avaliados preditores de mortalidade cardiovascular. Resultados:foram analisados 645 casos de cirurgia valvar, sendo 564 uni e 81 multivalvares. Não houve diferenças significativas em relação a idade, sexo e principais comorbidades (Tabela1). No entanto, o grupo univalvar apresentou menor incidência de fibrilação atrial (FA), maior prevalência de doença coronariana e maior clearance de creatinina. Ao ecocardiograma, pressão sistólica na artéria pulmonar e diâmetros de câmaras esquerdas foram maiores no grupo multivalvar, mas com fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) semelhante entre grupos. A doença reumática foi predominante na estenose (94%) e insuficiência mitral (36,2%), enquanto a doença degenerativa foi mais comum na estenose (77,9%) e insuficiência aórtica (36,2%). Pacientes reumáticos foram prevalentes, especialmente multivalvares (Tabela2). No grupo univalvar, predominou troca de válvula aórtica (51,8%) e mitral (33,2%), enquanto no multivalvar, troca de válvula aórtica ocorreu em 59,3% e mitral em 46,9%, plástica mitral em 48,1% e tricúspide em 21%. Tempo de circulação extracorpórea e anóxia foram maiores no grupo multivalvar, mas sem diferença nos desfechos em 30 dias (Tabela3). Na análise de regressão logística, a cirurgia multivalvar não foi preditor de mortalidade (OR:1,578, IC95%0,855-2,915, p=0,145). Os preditores foram: diabetes (OR:2,247, IC95%1,232-4,096,p=0,008), cirurgia cardíaca prévia (OR:2,094, IC95%1,085-4,041,p=0,028), FA (OR: 1,938, IC95%1,081-3,472,p=0,026), FEVE (OR: 0,962, IC95%0,942-0,982,p<0,001), hemoglobina (OR:0,805, IC95%0,704-0,920,p=0,001) e clearance de creatinina (OR:0,969, IC95%0,956-0,981,p<0,001). Conclusão:apesar de diferenças clínicas e ecocardiográficas, a cirurgia multivalvar apresentou desfechos semelhantes aos da univalvar, contrariando dados da literatura. Tal achado pode ser atribuído a avanços técnicos na intervenção valvar, contribuindo para melhores resultados mesmo em pacientes mais complexos.